sábado, 4 de maio de 2013

Do País entre a Política e a Gestão da Ruína...

No 39º aniversário do PSD não esteve presente nem um dos seus anteriores dirigentes!.. este "detalhe", potencialmente relativizável!, é, neste momento, um indicador incontestável do apoio social da atual governação!... De facto, apesar do seu estado de negação da realidade (sustentado pelo poder da palavra de Cavaco Silva), o governo de Passos Coelho está politicamente isolado... Vale a pena relembrar que a ideologia que o aparelho governativo diz professar, é a que subjaz ao texto que vale a pena reler e que passo a transcrever... porque, de facto!, a forma como está a ser gerida a economia e a sociedade não tem nada de social nem de democrata! - e essa é a maior evidência de que estamos perante uma forma de fazer política de tal forma destrutiva que nem o nome de política merece mas, apenas, o de gestão contabilística da ruína e da falência!

Carta Aberta de Silva Peneda ao Ministro das Finanças Alemão:
 
 
"O Senhor Ministro afirmou que há países da União Europeia que têm inveja da Alemanha. A primeira observação que quero fazer, Senhor Ministro, é que as relações entre Estados não se regem por sentimentos da natureza que referiu. As relações entre Estados pautam-se por interesses.
Queria dizer-lhe também, Senhor Ministro, que comparar a atitude de alguns Estados a miúdos que na escola têm inveja dos melhores alunos é, no mínimo, ofensivo para milhões de europeus que têm feito sacrifícios brutais nos últimos anos, com redução muito significativa do seu poder de compra, que sofrem com uma recessão económica que já conduziu ao encerramento de muitas empresas, a volumes de desemprego inaceitáveis e a uma perda de esperança no futuro.
E acrescentou o Senhor Ministro: “Os outros países sabem muito bem que assumimos as nossas responsabilidades…”. Fiquei a saber que a nova forma de qualificar o conceito de poder é chamar-lhe responsabilidade!
E disse mais o Senhor Ministro: “Cada um tem de pôr o seu orçamento em ordem, cada um tem de ser economicamente competitivo”. A este respeito gostaria de o informar que já tínhamos percebido, estamos a fazê-lo com muito sacrifício, sem tergiversar e segundo as regras que foram impostas.
Quando o ministro das Finanças do mais poderoso Estado da União Europeia faz afirmações deste jaez, passa a ser um dos responsáveis para que o projeto europeu esteja cada vez mais perto do fim.
Passo a explicar. O grande objetivo do projeto europeu foi garantir a paz na Europa e como escreveu um antigo e muito prestigiado deputado europeu, Francisco Lucas Pires, “… essa paz não foi conquistada pelas armas mas sim através de uma atitude de vontade e inteligência e não como um produto de uma simples necessidade ou automatismo…”. A paz e a prosperidade na Europa só foram possíveis porque no desenvolvimento do projeto político de integração europeia teve-se em conta a grande diversidade de interesses, as diferentes culturas e tradições e os diferentes olhares sobre o mundo. Procurou-se sempre conjugar todas essas variedades, tons e diferenças dos Estados-membros numa matriz de valores comuns.
Esta declaração de Vossa Excelência põe tudo isto em causa, ao apontar o sentimento da inveja como o determinante nas relações entre Estados-membros da União Europeia. Quero dizer-lhe, Senhor Ministro, que o sentimento da inveja anda normalmente associado a uma cultura de confrontação e não tem nada a ver com uma outra cultura, a de cooperação.
Com esta declaração, Vossa Excelência quer de forma subtil remeter para outros Estados a responsabilidade pela confrontação que se anuncia. Essa atitude é revoltante, inaceitável e deve ser denunciada.
A declaração de Vossa Excelência, para além de revelar uma grande ironia, própria dos que se sentem superiores aos outros, não é de todo compatível com a cultura de compromisso que tem sido a matriz essencial da construção do sonho europeu dos últimos 60 anos.
Vossa Excelência, ao expressar-se da forma como o fez, identificando a inveja de outros Estados-membros perante o “sucesso” da Alemanha, está de forma objetiva a contribuir para desvalorizar e até aniquilar todos os progressos feitos na Europa com vista à consolidação da paz e da prosperidade, em liberdade e em solidariedade. Com esta declaração, Vossa Excelência mostra que o espírito europeu para si já não existe.
Eu sei que a unificação alemã veio alterar de forma muito profunda as relações de poder na União Europeia. Mas o que não deveria acontecer é que esse poder acrescido viesse pôr em causa o método comunitário assente na permanente busca de compromissos entre variados e diferentes interesses e que foi adotado com sucesso durante décadas. O caminho que ultimamente vem sendo seguido é o oposto, é errado e terá consequências dramáticas para toda a Europa. Basta ler a história não muito longínqua para o perceber.
Não será boa ideia que as alterações políticas e institucionais necessárias à Europa venham a ser feitas baseadas, quase exclusivamente, nos interesses da Alemanha. Isso seria a negação do espírito europeu. Da mesma forma, também não será do interesse europeu o desenvolvimento de sentimentos anti-Alemanha.
Tenho a perceção de que a distância entre estas duas visões está a aumentar de forma que parece ser cada vez mais rápida e, por isso, são necessários urgentes esforços, visíveis aos olhos da opinião pública, de que a União Europeia só poderá sobreviver se as modificações inadiáveis, especialmente na zona euro, possam garantir que nos próximos anos haverá convergência entre as economias dos diferentes Estados-membros.
As declarações de Vossa Excelência vão no sentido de cavar ainda mais aquele fosso e, por isso, como referiu recentemente Jean-Claude Juncker a uma revista do seu país, os fantasmas da guerra que pensávamos estar definitivamente enterrados, pelos vistos só estão adormecidos. Com esta declaração, Vossa Excelência parece querer despertá-los.
José da Silva Peneda
Presidente do Conselho Económico e Social"

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