segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Minaretes e Sinos versus Liberdade e Laicidade...










Minaretes, Sinos, Campainhas... símbolos de "chamamento", sinais de exercício de um poder dirigido a outrem... no espaço público, torres de igrejas e minaretes assinalam o local em que sacerdotes e almuadem chamam os fiéis à oração... igrejas e minaretes sacralizam o espaço, numa apropriação consentida pelo costume e a História dos povos, das culturas e dos lugares... Nos dias que correm, em sociedades que se pretendem laicas, democráticas e livres, sociedades que compreenderam já a natureza da necessária coexistência pacífica entre crenças, religiões, ideologias e identidades para a preservação de uma Humanidade que reconhecemos multicultural, sociedades em que o diálogo inter-religioso e a liberdade religiosa perceberam, unidos na sua diversidade e na prioridade do reconhecimento ao direito à paz e à igualdade, que a esfera do religioso pertence à dimensão dos direitos de cidadania, privados, com o direito ao respeito e ao reconhecimento de todos... não faria mais sentido, deixar igrejas e minaretes, sons de sinos e vozes de almuadem, no registo da construção histórica das sociedades em que vivemos? Ou valerá a pena reeditar guerras e conflitos (provocados, quiçá, intencionalmente, para o efeito) entre a diversidade do pensamento religioso, pretexto manipulável para o incendiar de conflitos sociais?... Não será mais adequado ao espírito democrático das sociedades laicas, a não exibição pública do poder religioso, dúbio poder de exercício da apropriação do espaço?... Porque a laicidade respeita a diversidade, garante a não-discriminação e permite o respeito e o reconhecimento da diferença, não seriamos todos mais iguais e mais livres se soubessemos resistir à tentação de exibir as fontes do nosso etnocentrismo e da nossa perigosa vontade de poder?

8 comentários:

  1. Seriamos todos mais iguais mas passarão tantos séculos para aplanar/aplacar a elevação aos céus dos poderes religiosos, laicos e todos os outros. Sacralizar o espaço poderá ser comparado à urina do macaco que, assim, marca o território? Tantos séculos passarão até que os macacos utilizem sanitas...:-]. Um abraço

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  2. Ana Paula
    Gostei muito deste texto.
    Um beijo

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  3. Este texto, sobretudo no final, sugere-me alguns comentários (que seriam muito mais vastos, não estivéssemos num blog). Antes de mais uma declaração de intenções: sou ateu.
    Dito isto:
    "Não será mais adequado ao espírito democrático das sociedades laicas, a não exibição pública do poder religioso, dúbio poder de exercício da apropriação do espaço?"
    Todas as formas de ideologias, todas as visões do mundo, estão imbuídas de poder de forma constitutiva, precisamente porque são formas de ver estar no mundo. Ora não há forma de estar no mundo que possa não se exibir e "conquistar" o seu espaço de estar no mundo (e a arquitectura é uma forma de estar no e organizar o mundo). Nas sociedades democráticas isso deve ser feito dentro das regras e do confronto democrático. Além disso, haverá que não esquecer que vivemos numa sociedade laica, mas maioritariamente crente.
    "Porque a laicidade respeita a diversidade, garante a não-discriminação e permite o respeito e o reconhecimento da diferença, não seríamos todos mais iguais e mais livres se soubessemos resistir à tentação de exibir as fontes do nosso etnocentrismo e da nossa perigosa vontade de poder?"
    Não eram, por exemplo, os Estados comunistas laicos? Não se perseguiam homossexuais? Ou etnias? As razões de ser da discriminação são de natureza que, embora possa englobar a religião (como poderemos longamente exemplificar), extravasam largamente a dicotomia religião/laicisismo. Estão mais ligadas à esfera de intercepção entre Poder e Identidades, nas mais variadas escalas em que ela se pode realizar (que dizer, por exemplo, da laica endogamia das universidades). A religião é agente de identidade, logo de diferenciação. Qualquer identidade é baseada simultaneamente em dois vectores: inclusão e exclusão ou comunhão e diferenciação. Os grupos de identidade definem-se pelo que são e pelo que não são (e outros são ou pensamos que sejam). O laicismo não é menos agente de identidade e não revela no seu interior menor apetência para o conflito identitário mais ou menos discriminatório.

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  4. Depois da polémica em França, das burkas, na Dinamarca com a BD sobre Maomé e dos versos de Salman Rushdie, os crucifixos em locais públicos (para quando acabar com os feriados religiosos, especialmente o NATAL?) já acabaram com o santo correspondente a cada dia do ano, passando assim ao dia mundial da voz, dia mundial do sono, do não fumador, etc. Há também os dias mundiais importantes, que não passam de hipocrisia, pois só se lembram desses problemas, como o da fome ou SIDA, nesse dia e de resto é para esquecer!), as religiões parecem de facto, condenadas a desaparecer e com elas todos os padrões éticos e morais por elas instituídos desde o mito até hoje
    Hoje já não há certezas de verdades absolutas nem tão pouco de certezas quanto ao futuro, à instituição família, ao amor ao próximo, à orientação sexual, aos afectos, ao bom nome, à honra, à dignidade da pessoa humana e sobretudo, ao preço a pagar pela liberdade de expressão.
    Neste novo Mundo do séc XXI a par da crise económica, tem vindo a alastrar-se de forma alucinante uma crise de Valores.
    Acabar com o dogma da Religião, ou Religiões, no sentido de "libertar" assim os humanos das "garras dos dogmas irracionais", que existem desde que o homem é homem, e que se sobrepuseram ao mito, causado pelo medo e incompreensão humana. Somos o único ser que sabe que vai morrer, desde tenra idade.
    As Religiões foram as bases ou pilares que construíram a sociedade humana, como uma orientação da faculdade que posssuímos do Livre Arbítrio, ou seja, podermos escolher a atitude a tomar, perante as mais variadas situações na vida.
    Como base, a religião tem por finalidade ajudar a destrinçar entre o bem e o mal. Neste preciso momento da História humana, a Nova Ordem Mundial, tem por finalidade acabar com a religião, conduzindo o humano, sem que este se aperceba, para o abismo da solidão e da falta de esperança.
    As religiões, áparte os seus fracassos (doutrinadas por homens e susceptíveis de serem injustas) eram um regulador da moral e da ética, forneciam ideais da vida em comunidade; as pessoas tentavam interpretar, ou não, e levar uma conduta mais ou menos coincidente com os bons costumes.
    A nossa sociedade contemporânea, não possuindo verdades absolutas, foi levada a crer que as religiões lhes usurpam o livre arbítrio, tornando-as escravas de um dogma, o que é verdade quando qualquer dogma abusa do poder...
    O dogma é imposto pela persuasão e nisso a política, nada tem de diferente da religião. A sociedade de hoje a despeito do seu progresso material, intelectual e político conduz cada vez menos à saúde mental e tende a sabotar a segurança interior, a felicidade, a razão e a capacidade de amor do indivíduo; tende a transformá-lo num autómato,que paga cada vez mais o seu fracasso humano com doenças mentais, físicas e desespero oculto sob frenesi pelo trabalho e busca de prazer.
    Quem diria que víveríamos de novo uma época das trevas, onde quem abusa do poder de persuasão não é a religião, mas sim o Estado, ou Estados? Isto não é mais que um sintoma de que um novo dogma, vem substituir os antigos... passamos assim dos dogmas religiosos ao político!
    Bem sei que seguir este novo dogma, para alguns é ainda imperceptível, devido ás capacidades de camuflagem das novas tecnologias aliadas à ciências, dentre as quais, a ciência social é determinante. Os Media influenciam pensamentos, sentimentos e acções de quase toda a gente, para que são então precisas as religiões se temos o futebol e como deus um Cristiano Ronaldo? Isto é apenas um exemplo.
    Assim e sem que as maiorias se apercebam, destrói-se uma capacidade inerente e exclusiva ao homem, o Livre Arbítrio!
    O que se vê, é que a humanidade foi destruindo os seus Valores Morais e Éticos, pensando que assim se torna mais livre pensadora do que nunca, cai exactamente no contrário... deixa de ser livre pensadora, torna-se mais manipulável e não tardará muito, pensará que entre vida ou morte... nada terá a perder.

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  5. continuação:
    Nunca um dogma se deu bem com outro dogma, pois enquanto o religioso defende os Valores o político económico defende os Não Valores. Os não valores estão para as ditaduras, assim como os valores estão para as religiões. Cada vez mais o homem sem se aperceber, transforma-se num autómato, a vontade de ordem e de organização em excesso, sufoca o espírito criador e elimina a própria possibilidade de Liberdade.
    Vamos satisfazendo dia a dia, a vontade dos nossos governantes sem nos apercebermos, pois são peritos em nos inculcar que as escolhas são apenas nossas, mas não... são extremamente influenciadas e manipuladas.
    Entretanto a violência é amplamente difundida e cresce a passos largos, a droga e outros problemas da humanidade, crescem de forma diametralmente oposta.
    Entretanto muitos “vendedores de ilusões”, hão-de aproveitar-se, para benefício próprio, da actual fragilidade daqueles que sempre foram vitimas dos usurpadores da vontade. Quando dermos por isso, seremos um bando de ignorantes ao sabor da palavra tolerância, que tanto nos tentam impingir, mas que eles próprios não usam, acabando com liberdades e direitos adquiridos pelos povos, há já imenso tempo!
    Dá que pensar e pensando profundamente no assunto, até dói!

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  6. Nesde último comentário muito se disse com o qual concordo e muito se disse com o qual discordo. Mas acima de tudo, e como ontem fui ver a encenação do Banqueiro Anarquista, lembrou-me a máxima do livro: A Liberdade é uma Tirania, ou como se projectava na sala To be free is to be free from to be free.

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  7. Por isso querida Ana Paula, e vai desculpar encher a sua caixa de comentários, com o que penso... mas é como diz, a Liberdade, consiste em respeitar as diferenças e a diversidade...
    Não como ouvi ontem na TSF, no "minuto económico", que em Birmingham, a polícia resolveu fazer uma autêntica "caça ás bruxas", em jardins de infância, com meninos muçulmanos de 4 anos, a serem vigiados o dia todo, pois poderão vir a ser potenciais terroristas! Está a causar a repugnância e o medo dos cidadãos locais. O Estado laico, que tanto se quer impor e que os rotulou de fundamentalistas, está a descer ao mesmo nível, em vez de promover os Direitos Humanos! Mais do que isso, está para mim, a querer acender rastilhos muito perigosos.
    Imposições fundamentalistas laicas, podem ser tão perigosas como as religiosas.
    E desculpe tomar-lhe o seu espaço... :))

    Um beijinho de um grão de pó, para um pirilampo muito iluminado. :)

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  8. Caros Amigos,

    Pela qualidade das reflexões que aqui têm sido partilhadas, limito-me a um comentário colectivo, agradecido e feliz, pelo diálogo interessante e substantivo que aqui se tem desenvolvido que, contudo, mais não pretende do que aumentar os contributos para pensar uma matéria que, cedo ou tarde, se tornará central no equacionar dos equilíbrios da organização societária. As "marcas territoriais" referidas pelo Fernando Cardoso são, na minha opinião, um dado importante a reter para a reflexão sobre esta matéria (obrigado pelo contributo, Fernando!)... de facto, na actualidade, mais ou menos sofisticadas, as marcas identitárias no espaço público, devem (não por imposição -porque, tal como bem diz a Fada do Bosque, as imposições fundamentalistas, qualquer que seja a sua origem, são sempre ditatoriais), por consciência da responsabilidade social implicada na gestão da coexistência social que se pretende plural e pacífica, discernir o público e o privado, enquanto estratégia pedagógica para o exercício dos Direitos Humanos... deste modo, podemos pensar a laicidade como uma construção necessária à democracia participada e não (como alerta António Valera) como reprodução de práticas do passado que deturparam o sentido do que conceptualizamos como adequado às sociedades contemporâneas... o facto é que, se não actuarmos com a humildade e o respeito pela diversidade que podem conter a exibição e o poder económico a que não são imunes as exibições ideológicas e religiosas, corremos o risco de, em nome dos valores, incorrer em procedimentos competitivos e concorrenciais, provocatórios e potencialmente capazes de alimentar os pretextos que todos os fundamentalismos aguardam oportunisticamente para se vitimizarem... o bem-comum e a diversidade multicultural, no reconhecimento e respeito pelos Direitos Humanos requer responsabilidade social, contenção e pedagogia... de outro modo e sem a co-responsabilização da própria cidadania que a educação deveria consolidar, ficam em causa a liberdade, a igualdade e a ética...
    Um grande abraço a todos :)

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