"«Alguns dos comentários à decisão histórica do Tribunal Constitucional estão a ser de uma desonestidade intelectual tão espantosa que mesmo tendo em conta o baixo nível geral do debate político no nosso País se fica de boca aberta. É evidente que uma carga fiscal distinta para funcionários públicos e pensionistas, por um lado, e para os restantes cidadãos, por outro lado, viola abertamente o princípio constitucional da igualdade. A única discriminação que é aceitável à luz da Constituição é a progressividade dos impostos em função dos patamares do rendimento de cada um, e nunca o tratamento diferenciado de cidadãos com o mesmo rendimento. Seria o mesmo que aplicar aos funcionários públicos uma ponderação diferente do seu voto nas eleições ou aos pensionistas uma pena agravada para um mesmo crime cometido, por comparação com qualquer outro cidadão. Uma situação de emergência nacional - que de resto careceria de ser declarada como tal pelas instâncias competentes nos termos da própria Constituição - poderia justificar medidas excepcionais no plano fiscal, mas estas teriam sempre de ser distribuídas equitativamente pelos cidadãos, sem situações de privilégio ou de desfavor em função da respectiva entidade patronal - pública ou privada - ou da respectiva situação laboral de trabalhador no activo ou na reforma. A urgência do equilíbrio das Finanças públicas não permite ao Governo um confisco discricionário exercido apenas sobre determinados grupos de cidadãos, nem as metas de qualquer Memorando com parceiros internacionais se podem sobrepor à Lei Fundamental da República. E não se trata sequer de matéria susceptível de alteração no quadro de uma eventual revisão constitucional. Mesmo nesse caso o princípio da igualdade nunca seria passível de restrição porque é uma base essencial do Estado de Direito. Por último, não é verdade que o Tribunal Constitucional tenha alterado na decisão deste ano o critério de constitucionalidade que aplicou em relação ao Orçamento de Estado do ano passado. Pelo contrário, o TC tinha já considerado explicitamente em 2012 que o corte dos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas era inconstitucional, deixando claro que não toleraria a repetição dessa medida em anos subsequentes. Tentar fazer do TC o bode expiatório da gritante incompetência do programa económico do Governo não passa de uma desculpa de mau pagador, a esconder uma postura fundamentalmente antidemocrática que pretende sacrificar os direitos, garantias e liberdades da Constituição aos caprichos da falsa inevitabilidade do pensamento único neoliberal».
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