O papel da Igreja no apoio ao assistencialismo social tem sido perspectivado, por várias governações, como uma mais-valia de um sector da sociedade portuguesa que se não avoca como político... contudo, num Estado de Direito democrático, laico e progressista, deixar a política social nacional vulnerável à sua reivindicação pelo poder religioso, é, no mínimo, grave. Há dias, quando a Igreja anunciou o lançamento de uma nova face do seu "projecto social", fiquei a pensar que a expressão representa, mais ou menos conscientemente, uma intencionalidade que transcende o acto assistencialista e humanitário e a interrogação colocou-se-me, subitamente irónica: será que a Igreja vai a votos nas próximas eleições?... Hoje, num dos jornais da tarde, ouvi excertos de intervenções de Cavaco Silva, Presidente da República e de Durão Barroso, Presidente da Comissão Europeia, em iniciativa pública caracterizada pelos jornalistas como protagonizada por e para "Gestores Cristãos"!!!... e, numa sala cheia de pessoas, maioritariamente - se não, quase exclusivamente! - do sexo masculino, em que os dois intervenientes criticaram a falta de apoios sociais aos mais desfavorecidos e a necessidade de um compromisso ético nesse sentido, o Cardeal Patriarca de Lisboa, José Policarpo, afirmou que o lucro é legítimo se o seu fim fôr a defesa do bem-comum... o público era, repito, segundo a informação da cadeia televisiva em que me dei conta deste evento, constituído por "gestores cristãos"... num ano marcado por actos eleitorais sucessivos e num momento em que se discute a penalização do enriquecimento ilícito, estaremos perante o simples voluntarismo de expressões de solidariedade social? ... tratar-se-á de uma pura coincidência irrelevante?... ou, dado o perfil político dos interventores e o facto do Vaticano ter passado a emitir regularmente sinais claros de exercício de influências socio-políticas, estaremos face ao desenvolvimento de um "projecto social", protagonizado pela Igreja através de uma rede de aliados em áreas estratégicas como o são a economia e a política? ... afinal, nas eleições europeias está em causa muito mais do que se assume... lembremo-nos que, como há relativamente pouco tempo dizia numa grande entrevista televisiva o Professor Adriano Moreira, o Tratado de Lisboa foi objecto de discussão porque, no seu Preâmbulo, se tentou integrar a afirmação da Europa como comunidade cristã... pois!...
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