terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Migrações Ciganas e Xenofobia


As atitudes e comportamentos sociais tendem a radicalizar-se no contexto das crises sociais... seja em relação a estrangeiros, seja, simplesmente, em relação aos que, ainda que partilhando a mesma nacionalidade, vivem segundo códigos e regras de conduta distintas das que se consideram padronizadas... deste dito "país de brandos costumes" reza a História uma longa tradição discriminatória que não podemos ignorar ou recusar-nos a compreender... particularmente quando as migrações conduzem as minorias ao regresso ao nomadismo forçado... estou a pensar nos povos ciganos e, particularmente, nos seus cidadãos que descem da Europa Central como romenos para mais facilmente escaparem ao racismo e à xenofobia de uma Europa que apregoa Direitos Humanos mas se furta a encarar os seus próprios condicionalismos culturais, fantasmas velhos de uma sociedade fortemente estratificada, feita de medos e perseguições que deixam vestígios espalhados, mais ou menos visivelmente, pelo tempo... Há tempos, corria o ano 2000, após ter organizado, no Instituto Superior de Serviço Social, o colóquio "Representações Sociais e Xenofobia - o caso dos ciganos no Alentejo", participei num Forum "Culturas Periféricas/Vivências Conjuntas" organizado pela CMBeja e daí resultou o texto publicado, em 2005, na Revista Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol.45 (1-2) onde, a propósito da correlação entre identidades culturais e intervenção social, escrevi:"(...) para os ciganos, «os gadgé são traidores e a sua palavra não vale nada», enquanto para os não-ciganos, «o cigano é esperto, está ali para nos enganar» ou «somos sempre enganados pelos ciganos»... Trata-se, de um certo ponto de vista, de um equívoco comunicacional fundado numa transferência psicanalítica de ostentação sublimatória e de uma catarse pelo passado de exclusão de que a generalidade dos cidadãos não-ciganos se sente herdeira e de que não quer ser protagonista, reconhecendo -e aí reside o fundamento da conflitualidade latente- a competência cigana em "tornear" o estado de obediência a que o controle socio-económico reduziu a autonomia e liberdade do povo não-cigano.(...) É o desemprego, a pobreza e a exclusão que a sociedade proporciona que justifica o agravamento da violência social. Racismo e xenofobia para com as minorias, em particular, com os ciganos, são afinal, atitudes catárticas de transferência dos sentimentos de rejeição e exclusão social a que os indivíduos procuram, num esforço pelo reconhecimento da sua integração social, escapar."... Num tempo em que, por um lado, se valoriza a diversidade cultural e, por outro, se temem as migrações, convém não permitir que se ignore que a cultura cigana participa do Património da Humanidade.

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