sexta-feira, 12 de junho de 2009

"Presunção e Água Benta...



... cada um toma a que quer!" - vox populi dixit... lema de aplicação diversa, de natureza plástica, ocorreu-me hoje a propósito da entrevista de Francisco Louçã ao Jornal I (a ler aqui)... uma leitura rápida do que Louçã veio a público dizer, conduz-nos inevitavelmente à constatação de que, efectivamente, qualquer que seja o quadrante político em que pensam ou dizem mover-se, os protagonistas partidários são vítimas do que, também vox populi dixit a propósito do poder: "lhes sobe à cabeça"... na verdade, como podemos interpretar meia dúzia de observações que aqui proponho à reflexão, sem prejuízo de uma posterior análise? Por exemplo, que legitimidade confere um (apenas um, sublinho) resultado eleitoral, resultante de umas eleições específicas, marcadas por uma extraordinária abstenção e pelo facto de não comprometerem os eleitores com um voto de confiança para a governação nacional, ao ponto de se afirmar, sem aparente margem para dúvidas, que o BE é a terceira força político-partidária nacional? A humildade, a prudência e a consciência democráticas aconselhariam a que, antes desta contundência, se aguardassem os resultados das Legislativas e, mais ainda, os das Autárquicas... ou não?... O que pode justificar a previsão categórica de que: "(... ) O PSD não pode ganhar as eleições. Não tem condições nenhumas para ganhar as eleições.(...)" senão um exercício de puro oportunismo político que hipoteca os meios aos fins, para retirar votos ao PS sob pena de contribuir decisivamente para a criação das tais condições necessárias à reedição de vitória neoliberal de má-memória dos tempos do cavaquismo e do "barrosismo-santanista"? Seria de esperar que a Esquerda consciente e responsável preferisse minimizar a vitória da direita que grassa, como uma ameaça, por toda a Europa, da Holanda à Itália, à Austria e à República Checa com o crescimento da extrema-direita... ou não? O que implica a afirmação formulada, em tom definitivo, da indisponibilidade para a governação com os socialistas, que se não esgote na recusa do comprometimento com as soluções governativas, a não ser que o combate ao Partido Socialista é uma prioridade do BE, apesar disso poder significar o agravamento do carácter liberal das previsíveis medidas políticas que uma eventual vitória do PSD significaria? Denota afinal que o crescimento da sua representação parlamentar é mais importante do que a defesa do interesse público... ou não? O que significa, no contexto de uma organização económico-social destituída de aparelho produtivo, a defesa da nacionalização de sectores estratégicos, contraposta à assertiva descrença e condenação da regulação do mercado? O esvaziamento das dinâmicas do mercado económico, a condenação da reforma da sua regulação e a defesa do centralismo do Estado na economia... ou não? Como interpretar a defesa da saída da Nato e o fim da integração das forças multilaterais em contextos de guerra, num tempo em que a interdependência e a globalização de problemas e soluções apela à união de todos, no quadro de consensos construídos e afirmados pelas Nações Unidas... Como perspectivar toda a doutrina panfletária qua apela a uma "esquerda grande"(?!), sem a menor referência à realidade portuguesa no que se refere às inexistentes condições de produção e ao nulo aparelho produtivo nacional?... pois... fazer política é muito mais do que produzir demagogia... até porque, fazer política e participar na governabilidade, são atitudes que não interessam à auto-promoção narcisista que tem desculpa, apenas e só em curtissimos espaços de tempo, enquanto se não consegue olhar em volta, de forma justa e inteligente... e avaliar o risco, procedendo em conformidade... porque é bom não esquecer: a crença não tem solução para os problemas objectivos das condições de vida das pessoas e a invenção de super-heróis é uma brincadeira que se não pode, de todo, levar a sério!...

15 comentários:

  1. Profª Ana Paula,

    Receio ter ficado sem palavras ou mesmo sem tema depois de ler este post...Tem toda a razão, o BE parece estar tomado de petulância...Nas legislativas lá voltará a ser largamente ultrapassado pelo PC...e nas autárquicas nem falar...
    Abraço.

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  2. Caro Sokinus,
    Sabe? ... uma das coisas que mais me impressiona é a facilidade com que se perde o distanciamento e a lucidez, "por artes" de um auto-deslumbramento que faz perder a côr e o "verniz" com que se veste, cuidadosamente, uma aparência "negligé" sob a qual se ocultam, demasiadas vezes, autoritarismos e vaidades... mas, como toda a moeda tem dois lados, fica assim, à vista, a face que, habitualmente, não se vê... além de lhe agradecer as suas palavras, quero ainda dizer-lhe que concordo com o que prevê relativamente aos resultados do PCP nas legislativas e, mais ainda, nas autárquicas.
    Abraço.

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  3. Cara Ana P. F.
    Reflecti sobre as suas palavras e, até mesmo sob um certo tom “tumulto”..“como perspectivar toda a doutrina panfletária qua apela a uma "esquerda grande"(?!)”..Apenas me ocorre a associação desta “Esquerda” à propensão para um “Terceiro Estado” (que inevitavelmente cairá no liberalismo)..Esquerda responsável quando se esqueceu que a “questão” era a Europa!!! E, quando vê: “ (...) no contexto de uma organização económico-social destituída de aparelho produtivo, a defesa da nacionalização de sectores estratégicos (...) creio que é precisa a integridade para apresentar "claramente" a projecção da tendência, na medida em que será “sempre” a determinação futura do problema de acordo com sua evolução natural no passado, caso se mantenham as condições actuais... Mas enfim, sempre no mesmo “dilema” do «zoon logon ekon»...
    Abraço.

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  4. Bem observada esta associação com a "proprnsão para um "Terceiro Estado" (que inevitavelmente cairá no liberalismo)", Jeune Dame... e sim, apesar do eterno dilema do «zoon logon ekon», é sintomático o apelo a uma "grande esquerda" que de responsável pouco tem - ou o teor da campanha teria respeitado o seu objectivo...
    Abraço.

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  5. Cara Ana Paula
    Perdoe-me o sermão, mas não resisto ao apelo das suas palavras. Creio que o Bloco chegou onde chegou por mérito próprio - o mérito que sempre têm os que dizem a verdade e pugnam por causas que, como muitos concordam, são justas, lógicas e apontam para uma sociedade mais humana. Mas isso não faz de todos os outros mentirosos. Há imensa gente boa e verdadeira em todos os quadrantes do espectro político. Nem a todos, porém, coube o destino e a vontade de afirmarem esses princípios de forma pragmática, exequível nos termos do regular funcionamento das instituições e do regime democrático. Já vimos que sem verdade, honestidade e justiça, as leis feitas pelos representantes da nação e as medidas executadas pelos programas dos dois grandes partidos tenderão apenas para o pântano (a economia, essa, tende há muito para a "tanga"). Hoje, temos que nos haver com os miasmas herdados destas mais de duas décadas de governação, com o seu cortejo de infelicidades registadas por todos os partidos políticos e suas bancadas parlamentares a desenvolver os miasmas próprios de um pântano onde campeia a corrupção, os interesses mesquinhos, os favores, o abuso e o roubo de bens públicos em benefício de interesses promotores de um tipo de desenvolvimento que é mau para as pessoas - aqui como no resto da Europa.

    A este propósito, creio que um dos maiores desafios que hoje se colocam ao mundo é o da auto-suficiência alimentar dos povos - nesse ponto concordo com o seu alerta (é certo que o Bloco precisaria de alguém da craveira do Arqtº Ribeiro Teles para ter um programa para o ministério da agricultura). Europa sim, mas com um projecto de desenvolvimento ousado, racional, justo e, necessariamente mais inteligente em termos de sustentabilidade. É preciso iniciar o caminho que conduza, um dia, ao fim do desperdício de energia; acabar com a sujidade tóxica provocada pela proliferação de transportes destinados a transportarem mercadorias e força de trabalho. Permanentemente, irresponsavelmente, esgotando a Terra. Daí que seja preciso termos partidos e programas com pessoas inteligentes e propostas pensadas de acordo com princípios que considerem, em primeiro lugar, o bem comum, global. Precisamos de um novo modelo de desenvolvimento que nos afaste do regresso dos pesadelos - o nuclear, claro - e que nos defenda da loucura pós-humana que se antevê no horizonte dos laboratórios: a biologia e a química produziram conhecimentos que ameaçam já a sobrevivência de populações inteiras - quando não são as balas - atingindo especialmente algumas das que vivem junto dos recursos, seja nos desertos do Médio Oriente ou na Amazónia (veja-se o recente massacre de Bagua, na Amazónia peruana). Exércitos a combaterem civis nos seus locais de residência, querendo desalojá-los... Sempre igual, seja Gaza, o Iraque, a Indonésia ou a Amazónia.

    (continua...)

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  6. (continuação...)
    São precisos princípios, portanto.
    Ora, será que a governação pressupõe o cinismo das relações exteriores, negócios estrangeiros, interesses tidos como "nacionais"... e nos basta uns emails e uns abaixo-assinados em defesa do Tibete, da Palestina, etc. para aliviarmos a consciência (porque nos acrescentámos como unidade de conta à lista electrónica de subscritores de uma causa)? Será que vale a pena darmos o nosso voto aos partidos políticos que se têm revelado tão incompetentes e incapazes de velar pelos bens públicos, habituados a governar para satisfazer interesses de conjuntura e gerir o défice, sem ter um projecto de futuro, visão do interesse público, ideias...? Todos eles sempre tão aquém dos ideais sãos da defesa dos povos, do meio-ambiente, da liberdade...

    É preciso que os sectores estratégicos para a sobrevivência colectiva não entrem na órbita da mercadoria. O Bloco defende isso mesmo. De resto, não concordo com a sua análise, nomeadamente com a demagogia e auto-promoção narcísica, espressões que se aplicam bem a inúmeros pavões do dois grandes partidos mas que, dirigidas à esquerda do PS, são acusações demasiado fáceis, como "esquerda caviar" e outras que a mim me parecem inadequadas para uma força política que tanto se tem empenhado por causas que transformam, sim, a vida das pessoas, mas não irei enunciar.

    Desculpe a "largura de banda"

    Francisco Oneto

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  7. Caro Francisco,

    Obrigado pela "largura de banda"... por vezes, é necessária de modo a ficar claro o que pretendemos expôr. Compreendo a sua análise e o tecer de todas as considerações que aqui apresenta; porém, o que no texto que agora comentamos, pretendi dizer, partiu da minha constatação perante o teor da entrevista que assinalei com link para o Jornal I onde foi publicada a entrevista com F.Louçã. De facto, urge mudar as políticas de modo drástico, partindo da adopção de regras e princípios adequados aos tempos e problemáticas de hoje. Porém, se atendermos à questão da denúncia crítica sobre o modo como são geridas pelo poder as formas de organização, defrontamo-nos com uma realidade assaz complexa que se não pode reduzir à linearidade do que, habitualmente, o faz o BE. E se, muitas vezes, é gratificante assistir ao desassombramento com que se desmistificam práticas correntes da dimensão política e político-partidária, esta entrevista denota, na minha opinião, uma cegueira tradicional "no meio"... porque a intervenção não pode reduzir-se a diagnósticos ou posturas assentes em subjectividade e calculismo... e foi o que li na entrevista ao Jornal I... quero, entretanto, exclarecer que o facto de eu ter avocado a mentira foi feito a título de exemplo, no sentido de denotar que as determinações e desejos de cada político não podem confundir-se com a realidade... nesse sentido, quando acontece esta justa (ou sobre)posição defrontamo-nos com o exercício demagógico que se esgota em si próprio, contribuindo para se aumentar um "ruído" que agrava e precipita decisões eleitorais que acabam por se revelar contraproducentes... Francisco Louçã caiu na tentação, segundo deduzo do que li no I, deixando à vista um certo calculismo eleitoralista que, sendo legítimo, vem reforçar as posturas tradicionais. Não se trata, portanto, de falar em "esquerda caviar" ou outros epítetos... trata-se isso sim de exigir maior responsabilidade cívica e política... mais tarde, provavelmente, ainda hoje, tornarei mais claro o que penso e aguardarei o seu comentário... porque é importante pensar, reflectir e dissecar estas percepções...
    Até mais logo.
    Abraço.

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  8. ... desculpe, acabei de verificar que a palavra "esclarecer" está mal escrita no comentário anterior... foi lapso, claro... um horrível mas, acidental lapso decorrente de estar a escrever à pressa, sem atenção ao "teclar" ... até mais logo (penso publicar outro post sobre a matéria). abraço

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  9. Caro Francisco,
    Acabei de inserir outro post mas, afinal, diferente do que previra... por isso, dou continuidade à nossa troca de ideias aqui mesmo, nos comentários onde podemos desenvolver o debate. Ainda a propósito da entrevista de F.Louçã e da sua defesa da nacionalização dos sectores estratégicos, de facto, penso que é uma questão importante que, contudo, não pode ser apresentada de ânimo leve já que o facto, por si só, pode não resolver os problemas dos cidadãos e até agravá-los, se não fôr acautelada a inexistência de concorrência em caso de nacionalização... não podemos esquecer que uma concentração estatal de meios pode estrangular a economia, particularmente num tão pequeno país como o é o nosso. De igual modo, neste momento, soa também um pouco a extemporânea a defesa da saída da Nato, no actual contexto da correlação de forças internacionais em que Nações Unidas, União Europeia, EUA e Nato actuam como agentes de uma plataforma de interfaces em que é preciso estar presente para contribuir para um funcionamento institucional mais equilibrado e pacífico... nos termos em que F.Louçã coloca o problema, somos levados a pensar que também a saída da UE poderia ser defensável... repare que, por mim, nem sequer teriamos exércitos nacionais; contudo, os meus sonhos e desejos sobre o que penso melhor para a existência não podem eliminar a minha capacidade de compreensão do funcionamento pragmático do mundo, na consciência de que a minha opinião não faz o mundo... devo, por isso, ser fiel à consciência da relatividade das verdades e do espírito democrático. O que penso ter resultado da entrevista do líder do BE é a defesa de uma série de atitudes mediáticas, cuja adopção efectiva deixaria o país, de novo, na situação que já nos foi tão penosa durante quase meio século e que ficou conhecida pela expressão "orgulhosamente sós"... contudo, desta vez, essa opção significaria hipotecar mais uma ou duas gerações e, em política, não podemos esquecer nunca que a primeira de todas as prioridades é a defesa do interesse público... por isso, falei em demagogia e narcisismo, porque senti que a mensagem era altamente panfletária e nada de positivo trazia à resolução da situação económica-social dos portugueses cuja sobrevivência começa, em muitos casos, a dar sinais de insustentabilidade. O problema que se me coloca desde sempre é o da eficiência e da eficácia de aplicação à sociedade portuguesa de um modelo económico que liberte os cidadãos da pobreza e, no quadro da inexistência de um aparelho produtivo auto-suficente, não vejo no isolamento nacional qualquer solução útil à população porque não considero que se possa decidir sobre a vida de outrem em função de experimentações conjunturais que, à partida, nada podem garntir em termos de sucesso de resultados... pelo contrário - se atendermos à nossa permanentemente histórica dependência das relações internacionais. A mudança é um processo que requer, para não sacrificar os cidadãos, uma orientação indispensável que deve ser conduzida nos termos de uma sustentabilidade consolidada. E, por vezes, no "calor" do enstusiasmo, os políticos aderem ao discurso fácil, de "café" onde o mundo se resume a meia dúzia de boas intenções...(continua)

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  10. (continuação)
    só em jeito de um pequenino exemplo, subscrevo incondicionalmente o que diz sobre a gestão da pasta da Agricultura... e o mesmo estou certa que poderiamos dizer da Educação (que se não reduz à solidariedade com professores descontentes tanto mais que a razão de ser da escola são, nada mais, nada menos, do que os alunos), da Saúde, da Indústria, do Comércio, da Cultura... a densidade complexa da sociedade que temos determina, exponencialemnte, a complexidade das soluções a encontrar... pretender que é linear e fácil, reduzindo os problemas a 2 ou 3 situações, pode ser motivador do combate político mas, por um lado, não garante viabilidade às sugestões políticas anquilosadas ou simplistas; por outro lado, não permite a consolidação incondicional da confiança indispensável à reconstrução do país que contianuamos a adiar... Há muito a fazer... mas há, seguramente!, antes disso, muito a pensar! Um abraço.

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  11. Adoro ler os seus argumentos, que são muito bem construídos...
    ... mas para não me alongar, quero apenas destacar o que é fundamental - o que neste momento me impressionou:
    «por mim, nem sequer teriamos exércitos nacionais; contudo, os meus sonhos e desejos sobre o que penso melhor para a existência não podem eliminar a minha capacidade de compreensão do funcionamento pragmático do mundo, na consciência de que a minha opinião não faz o mundo... devo, por isso, ser fiel à consciência da relatividade das verdades e do espírito democrático.»
    Aqui é que encontramos matéria prima para uma longa reflexão sobre a condição humana...
    Obrigado Ana Paula

    Francisco Oneto

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  12. Eu "não sei" agradecer a generosidade, a grandeza e o despojamento das suas palavras, Francisco... resta-me dizer, sentida e sinceramente: muito, muito obrigado!...

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  13. Só uma pequena pergunta.... Em que parte da entrevista F.Louçã afirma "sem aparente margem para dúvidas, que o BE é a terceira força político-partidária nacional" ?

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  14. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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  15. Caro José Barroso Dias,
    Antes de mais, esclareço que removi a 2ª versão do seu comentário uma vez que chegou repetido. Quanto à pergunta que aqui enuncia, pode constatar que, sendo a afirmação em causa da autoria da própria jornalista, houve, ao longo da entrevista, oportunidades suficientes para a sua correcção/reformulação se assim o entrevistado tivesse considerado adequado... porque todas as perguntas visam criar espaço para a emissão de respostas, ficando estas ao critério do interpelado de quem se espera o ajustar do teor dos pressupostas e interrogações ao sentido por si considerado justo e adequado.

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