Merecem hoje destaque, no Leituras Cruzadas, dois artigos de opinião dados à estampa na edição do dia (18/07) do jornal Público. Um, intitulado "A Guerra dos Capitais" é da autoria de Fernando Belo que, a propósito da crónica de Rui Tavares publicada neste jornal no passado dia 13, evoca o livro escrito em 1944 por Karl Polanyi La Grande Transformation. aux origines politiques et economiques de notre temps, para relembrar a "implosão" da sociedade e da economia provocada, na opinião do autor, pelo mercado auto-regulador que o liberalismo inglês defendeu e em cujo contexto (1914-1944) eclodiram 2 guerras... e é à explicação desta dita "implosão", fundamentada em pressupostos errados que presumiam a aplicação generalizada a todos os produtos dos conceitos de "mercadoria" e "mercado" (enquanto "objecto produzido para ser vendido no mercado" e "contactos efectivos entre compradores e vendedores"), que Fernando Belo recorre, dizendo: "(...) este postulado, diz Polanyi, é falso no que diz respeito à força de trabalho, à terra e à moeda, já que nenhum foi produzido para ser vendido, nenhum é, pois, «mercadoria». Os três devem ser preservados do estatuto mercantil que o liberalismo lhes atribuiu.(...)". Na verdade, a pertinência destes argumentos datados da primeira metade do século passado é, segundo F.Belo, de um "relevo intempestivo" nos dias que correm, se atendermos: 1) ao aumento assustador do desemprego e à "demolição" dos contratos de trabalho em que assentava a organização económica democrática; 2) ao facto da "terra" já não ser terra agrícola mas, "território organizado industrialmente" e 3) ao actual ataque ao euro, uma vez que as moedas servem para comprar e vender mercadorias mas não a si próprias, como é característico do "(...) absurdo a que os financeiros podem chegar em suas guerras de capitais.(...)". Considerando que a actual crise repete a da primeira metade do século XX, Fernando Belo deixa a pergunta: "(...) Como será possível ter em atenção os argumentos de Polanyi, senhores economistas, transpô-los para esta crise e para a reformulação da vossa ciência, que Friedman despolitizou e tão graves consequências está a ter?"... O outro artigo de opinião a que me refiro é de Domingos Ferreira, intitula-se "Apocalypse Now" e começa assim: "(...) A Europa da solidariedade, da moeda única, da liberdade de pessoas e capitais num espaço sem fronteiras está fortissimamente ameaçada (...)". Considerando que os actuais líderes europeus não têm visão política para além dos respectivos interesses nacionais, ao contrário de outros como Kohl, Miterrand e Delors que, na opinião do autor detinham "(...) uma profunda visão continental do projecto europeu (...)", Domingos Ferreira confronta os políticos contemporâneos com o facto de precipitarem eleições quando deveriam pugnar pela estabilidade política, cientes da profunda crise económica que atravessamos e acusa-os de hipocrisia quando criticam os pareceres negativos das agências de rating, uma vez que foram eles os grandes defensores do "(...) escrupuloso cumprimento das orientações das agências de rating (...)". Afirmando que se trata de uma forma de desresponsabilização política destes protagonistas, o autor analisa os argumentos das agências de notação financeira e as reservas dos países do Norte da Europa no que se refere à ajuda aos chamados "países periféricos" e afirma, no que se refere a todas as medidas ditas "alternativas": "(...) a implementação de qualquer um destes planos provocará inevitavelmente milhares de desempregados e falências. Deste modo, pode-se concluir que estas terapias não resultarão, dado que, só com o estímulo que representa grande parte dos 25 milhões de desempregados da UE voltarem ao trabalho, haverá crescimento económico e equilíbrio das contas públicas.(...)" . E, perguntando até quando estarão os eleitores dos países periféricos disponíveis para pagar as dívidas aos bancos dos países do Norte e até quando estarão os eleitores destes países do Norte disponíveis para ajudar aqueles, remata: "(...) Estas são escolhas que terão que ser efectuadas nas ruas de Atenas e nos gabinetes de Bruxelas, Paris, Frankfurt e Berlim. Estejam atentos, haverá muitas notícias, todavia, muito poucas serão boas.".
(Nota: o sublinhado a bold resulta da minha chamada de atenção para a afirmação em causa, sendo da minha autoria)
(Nota: o sublinhado a bold resulta da minha chamada de atenção para a afirmação em causa, sendo da minha autoria)
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