Há figuras assim, incontornáveis... com linguagens próprias, únicas como uma pele... Raul Solnado foi assim... conheci-o com 5 anos, nos ecrãs da televisão a preto e branco, num programa chamado "Zip-Zip"...
(este genérico foi retirado do YouTube onde se pode ler que terá sido transmitido apenas uma vez porque o Major Baptista Rosa, decisivo para a transmissão do programa quando corria o ano de 1969, abandonou a equipa... manteve-se o símbolo do Zip-Zip, o boneco mais giro do Portugal triste de então)
... e foi no Zip-Zip que ouvi a mais fabulosa rábula sobre a guerra... a Guerra Colonial de que, à época, se não podia falar e que trazia no seu âmago duras realidades, essas sim, indizíveis como só as dores das mães e das mulheres sabiam reconhecer na partida e na ausência dos filhos da terra, meninos arrancados à vida rural de um país pobre que nunca tinha férias ou viajava... meninos que iam perder a inocência para uma guerra que não era a sua e de que nunca voltariam intactos. Raul Solnado disse tudo isso... num tempo em que, repito, se não podia falar. Pela coragem e pela arte de uma vida que se tornou parte da alma de um povo, obrigado Raul!
(este genérico foi retirado do YouTube onde se pode ler que terá sido transmitido apenas uma vez porque o Major Baptista Rosa, decisivo para a transmissão do programa quando corria o ano de 1969, abandonou a equipa... manteve-se o símbolo do Zip-Zip, o boneco mais giro do Portugal triste de então)
... e foi no Zip-Zip que ouvi a mais fabulosa rábula sobre a guerra... a Guerra Colonial de que, à época, se não podia falar e que trazia no seu âmago duras realidades, essas sim, indizíveis como só as dores das mães e das mulheres sabiam reconhecer na partida e na ausência dos filhos da terra, meninos arrancados à vida rural de um país pobre que nunca tinha férias ou viajava... meninos que iam perder a inocência para uma guerra que não era a sua e de que nunca voltariam intactos. Raul Solnado disse tudo isso... num tempo em que, repito, se não podia falar. Pela coragem e pela arte de uma vida que se tornou parte da alma de um povo, obrigado Raul!
... foi preciso ainda um bom par de anos até que eu pudesse perceber a rábula de Raul Solnado, intitulada "A Guerra de 1908"... foi preciso ter encontrado meninas que se queixavam de não saber notícias dos irmãos que tinham ido para a guerra e visse procissões de mulheres que faziam promessas para que os soldados voltassem bem, inteiros e com saúde... foi preciso ouvir com atenção as mensagens de Natal e Ano Novo que os "rapazes" portugueses debitavam com coragem, rapidamente, aos microfones da televisão, a garantir às famílias enlutadas na alma que estavam vivos ainda que longe, no meio da mata - uma mata que o Zeca Afonso cantou e disse tão bem, na sua imortal canção com o mesmo nome... foi preciso o 25 de Abril!... para que eu, então já com 10 anos, percebesse a alegria incontida das pessoas com o fim da guerra... só depois, quando voltei a ver Raul Solnado na televisão e recordei a sua rábula, compreendi a sua inesquecível grandeza! ... Ao Raul, a minha sentida e sincera homenagem!
É momento de dizer: «Adieu».
ResponderEliminarAna Paula Fitas
ResponderEliminarParece que tenho as imagens da expressão do Raúl Solnado gravadas dentro da minha cabeça, como se estivesse a ver ao mesmo tempo que ouço a montagem do Youtube. Quanto me ri com essa rábula, num tempo em que "ir à guerra" era quase "vulgar".
Essa é a cena que melhor me lembro, mas com quantas outras não me ri, inclusive numa peça há poucos anos aqui em Famalicão.
Foi um excelente Homem, um excelente actor e comediante. Junto-me a si na homenagem sentida.
Jeune Dame,
ResponderEliminarPenso que todos os artistas sentem e expressam a despedida, sentida, com este «Adieu». Obrigado. Abraço.
Manuela,
ResponderEliminarTambém eu vejo tão claramente a expressão de Raul Solnado neste texto... é impressionante como a arte, com talento e significado, nos marca, não é?... tenho que confessar que apenas conheci o trabalho de Raul Solnado na televisão e no personagem extraordinário que protagonizou no filme "A Balada da Praia dos Cães" (que, segundo ouvi há pouco, Baptista-Bastos considerou melhor que o livro). Os bons merecem a nossa homenagem, cumprindo também assim mais um bom trabalho: o de reforçarem a nossa solidariedade. Obrigado. Um abraço.
Belo testemunho, Ana Paula. O Solnado iria amar as tuas recordações, estas palavras.
ResponderEliminarComoventes e generosas as tuas palavras, Valupi... Obrigado!... fico feliz por saber o que me dizes... um grande, grande abraço.
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