A visita do Papa Bento XVI a Portugal foi, essencialmente, política. Num momento em que os escândalos sexuais atingiram profundamente a credibilidade da instituição em todo o mundo, urgia uma manifestação pública de não-repúdio à Igreja Católica e, por isso, foi escolhido um país dito de "brandos costumes" e um povo de fé que, independentemente, das práticas rituais institucionais, continuasse as suas manifestações massivas de religiosidade popular. O culto mariano e o 13 de Maio representando exactamente esse alheamento oficial, apresentava-se, por isso, no espaço europeu, como o cenário mais adequado aos objectivos estratégicos do Vaticano que, de facto, preparou com profissionalismo todo o marketing que envolveu esta visita a que, os portugueses como bons hospitaleiros e na qualidade de cidadãos pacíficos, deram o acolhimento organizacional previsível tanto mais que, a parceria social da Igreja, através da sua rede institucional de intervenção social e a própria Presidência da República, se empenharam na demonstração da fidelidade tradicional aos valores e à mensagem jierárquica de uma doutrina tomada como dogma e independentemente dela poder (ou não) contrariar a obra e o pensamento de outros teóricos e agentes católicos. E se os 4 dias de visita poderiam surpreender, o facto é que forma necessários para que Bento XVI pudesse exibir uma imagem pública cujo climax foi preparado para as celebrações do 13 de Maio em Fátima, onde os peregrinos iriam de igual modo, quer o Papa estivesse (ou não) presente - e apesar de ser compreensível algum acréscimo no seu número, por todo o lado onde passou!, dada a curiosidade e o interesse em ver, "ao vivo", o representante máximo da entidade que se reclama legítima representante dessa fé popular em que assenta o catolicismo mariano. Para o final foi pois guardado o cerne da doutrina que Bento XVI quer deixar como sua marca no século XXI, depois de todo o apelo ao multiculturalismo, à pluralidade e à liberdade religiosa que tem caracterizado as últimas décadas, assente no esforço de pacificação de preconceitos e de relativização dos fundamentalismos - atitude política de reconhecida utilidade social no sentido da coexistência pacífica que é preciso assegurar no quadro de mobilidade que caracteriza as sociedades contemporâneas. Assim, para além da condenação do aborto, do casamento gay e do apelo ao cuidado recrutamento dos recursos humanos nas instituições cívicas de intervenção social ligadas à Igreja, Bento XVI veio ainda, politicamente, levantar um certo espírito de cruzada que não podemos deixar de associar, mais ou menos remotamente, a outras evocações religiosas em contextos culturais diferentes. Falamos da sua referência à minoria religiosa católica que as tendências demográficas fazem prever no curto e no médio prazo e, mais que isso, a uma espécie de reacender da militância pela dita identidade cristã europeia reivindicada politicamente de há muito contra a laicidade e a liberdade democrática da Europa Social que queremos construir. Ora, sabendo-se que defendemos o respeito pelos direitos das minorias nos verdadeiros contextos democráticos, é muito importante que se não confunda o trigo com o joio e que, sob a capa do medo, se levantem novas e mais diversas expressões fundamentalistas que, sob pretexto religioso, revertam em mais discriminação e consequentemente, em mais violência social. E, nesse sentido, é preciso que os cidadãos reforcem as suas competências cívicas exigindo, cada vez mais incisivamente, uma sociedade laica, garante da igualdade de oportunidades para todos, valorizadora da diversidade e da coexistência cultural. A terminar este apontamento, para além do que aqui escrevi há dias, permito-me relembrar outro facto ocorrido na sociedade portuguesa há pouco mais de um ano e sobre o qual escrevi em Abril de 2009 (ler AQUI).
Em perfeita consonância.
ResponderEliminarUm abraço, Ana Paula.
Obrigado, Miguel!
ResponderEliminarÉ bom saber isso :)
Um grande abraço.
Ana Paula,
ResponderEliminarGostei imenso do que escreveu e partilho em absoluto. O Papa, antecipou-se referindo «o pecado da igreja» (numa igreja cheia de pecados), mas mais adiante também foi dizendo que a igreja continua igual (aborto, preservativo, homossexualidade...), ie a grande distância da realidade.
Li, que em Portugal há 90% de católicos, fontes usadas o baptismo, mas o facto de termos sido baptizados, não tem nada a ver com outros rumos que se foram tomando. Óbvia a multidão, é uma característica de muitas pessoas, uns vão porque sim, outros vão para ver como é, vão na onda!...
Beijinhos,
Manuela
Manuela,
ResponderEliminarObrigado pelo excelente contributo que aqui partilha :)
Beijinhos :)
... o autentico espirito religioso é o espirito da liberdade... e quando uma religião se converte em mandamentos, algo vai muito mal!... chamo eu a isso, lavagem cerebral ou hipnose colectiva...
ResponderEliminarnão lhes perdoai, que eles sabem o que fazem!
Abraço :)
Saravah
Mais uma vez em perfeita sintonia.
ResponderEliminarSó acrescento que felizmente tenho a tv por cabo.
Até a minha Mãe que lê orações, já resmungava.
Enfim...
Boa noite, Ana Paula.
Amanhã,vou ter um dia dificil,triste...
Um beijo
Mais do que um país de "brandos costumes" é a velha tradição de manter o povo na ignorância. Quem desconhece factos, nem sequer imagina que está a ser manipulado.
ResponderEliminarSaravah, minha querida Amiga :)
ResponderEliminarSaravah!
Obrigado pela lucidez desassombrada das tuas palavras :)
Aquele Grande Abraço Amigo e um beijinho :)
Sim, Tina... até os crentes, lúcidos, "resmungam" perante o exagero...
ResponderEliminarVotos sinceros e sentido de muita coragem!
Um beijinho.
Isa,
ResponderEliminarSubscrevo na íntegra as tuas palavras cuja partilha, sinceramente, agradeço.
Aquele abraço :)