domingo, 5 de dezembro de 2010

Sá-Carneiro, entre o "caso Camarate" e a eleição presidencial








Recorrentemente, por esta altura e com particular destaque em períodos pré-eleitorais, a comunicação social ressuscita a questão do "caso Camarate" para mitificar a figura de Francisco Sá Carneiro... por isso, nomeadamente por nos encontrarmos em fase pré-eleitoral presidencial, pensei não referir o assunto - apesar de nada em especial me mover contra a criação de mais uma Comissão Parlamentar (mais uma, repito! a que acresce a estranheza do seu propósito não decorrer da obtenção de novos conhecimentos ou novas provas relativamente à tese de atentado que agora quase todos parecem corroborar!). Ainda que não partilhe da fundamentação assente numa pretensa descoberta de Ricardo Sá Fernandes sobre o facto das mortes políticas do século XX não terem sido devidamente explicadas e compreendidas (Ricardo Sá Fernandes referia-se às mortes de D. Carlos e de Sidónio Pais), a exploração do "caso Camarate" é ainda um "fetiche" para a direita portuguesa, de índole político-partidária e ideológica e não um caso de justiça (o que, naturalmente!, não posso deixar de lamentar!). Felizmente, há pessoas honestas e sociais-democratas de reconhecido e justo mérito que, chamadas a comentar o "momento", proferem juízos válidos e eticamente correctos. É o caso de Miguel Veiga, fundador do PSD, que, na RTPN, afirmou a propósito de Francisco Sá Carneiro: "Ele sempre se bateu contra os mitos. Mitificá-lo na morte é um grave feito contra a sua memória" ou do seu amigo Frei Bento Domingues que, num outro programa da RTP, contestou a mesma mitificação a que Sá Carneiro continua a ser sujeito com objectivos que, na sua opinião, podem ter motivações políticas e partidárias... entretanto e já agora, por se falar em questões partidárias, vale a pena referir que Artur Santos Silva disse no mesmo programa em que falou Miguel Veiga: "Sá Carneiro foi um grande estadista mas não foi um bom líder partidário. Ele não tinha paciência...". Tal como Maria João Avilez que considerou "uma demissão colectiva, um ultraje às famílias e uma vergonha", o reacender de um caso investigado durante 30 anos ao ponto de terem sido constituidas 8 Comissões Parlamentares para o efeito, Artur Santos Silva afirmou claramente que "o assunto deve ser enterrado" depois de tantas investigações e considerando as efectivas condições técnicas do voo que vitimou Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa.... a terminar este apontamento, vale a pena recordar que a dignificação da política e dos actos eleitorais requereria que o assunto não viesse neste momento, com este ênfase, preencher primeiras páginas da comunicação social ou justificar documentários e depoimentos não só de militantes sociais-democratas e democratas-cristãos mas, também, de candidatos à Presidência da República em 23 de Janeiro próximo.

10 comentários:

  1. Mais uma vez apareço para a contrariar, cara Ana Paula. Não se fala de Sá carneiro para o mitificar, fala-se sim, porque nunca se chegou a conclusão nenhuma convincente se tinha sido atentado ou acidente. Quer queiramos quer não, naquela altura era PM do meu País, como hoje é Sócrates. Foram feitas investigações sobre o desaparecimento de Sá Carneiro e dito tanta coisa como " o avião caiu por falta de combustível " também foi dito que " o motor da asa esquerda avariou" foi ainda dito que " a avioneta estava avariada antes da descolagem ", tudo isto dá a sensação de que - querem tirar o cavalinho da chuva - não foi acidente. Depois aparece um José Esteves, maluco?, não sei. Como é que nesta situação e passando mais um ano sobre a morte dele, não se fale no desaparecimento? Se ainda hoje se fala, se bem que menos, da queda da cadeira ou queda na banheira de Salazar, porque raio não se há-de falar numa situação pouco exclarecida se foi acidente ou atentado? haverá alguém com receio que se apure a verdade? É que até agora, só tem havido histórias mal contadas. Alguém, por exemplo, acredita que um piloto não tenha verificado se o avião estava em condições de levantar? Claro que acidentes.... acontecem e não está fora de questão esta situação ter sido uma delas.
    Abracinho e boa semana.

    ResponderEliminar
  2. Caro Zéparafuso,
    A questão que se coloca é a dos factos já terem prescrito e de já terem existido 8 Comissões Parlamentares para o efeito, sem que tenha sido apurada prova da tese de atentado. De facto, faria sentido investigar se novas provas tivessem aparecido mas, não parece ser o caso... além disso, se nos dias de hoje seria menos provável uma avaria técnica, dados os requisitos de segurança que se exigem, há 30 anos, não sei se não seria mais provável este tipo de problema - até porque o helicóptero tinha avariado na semana anterior... o que me causa mais estranheza e desconforto não é, naturalmente!, a evocação de alguém que foi PM de Portugal e que desapareceu subitamente, num período ainda "quente" da nossa jovem democracia mas, isso sim, que voltem a solicitar uma nova Comissão de Inquérito lançando mais uspeitas sobre um trabalho de que todos os grupos parlamentares fizeram parte, sem limitações, durante 8 (repito: 8 Comissões Parlamentares)... contudo, a mim não me incomoda a criação de uma nova Comissão para o efeito; o que me incomoda é que o façam em período pré-eleitoral mais ainda sem que, como disse!, nada de novo tenha sido revelado... e é lamentável que se recorra a questões desta natureza para, quiçá?, servir ou, pelo menos, deixar a suspeita de que estaremos, também, perante estratégias eleitoralistas... aliás, os próprios citados neste apontamento (Miguel Veiga, Artur Santos Silva, Frei Bento Domingues e Maria João Avilez) referem o despropósito da sugestão -tal como, aliás, o próprio Rui Rio! Do ponto de vista ético penso que, se a questão fosse de facto premente, já deveria ter sido suscitada, debatida e concluida (30 anos não chega?) ou, pelo menos, que o fosse depois da eleição do PR... porque é, no mínimo, de mau gosto, um candidato presidencial vir falar de uma personagem que se mitifica, permitindo que a sua intervenção denote ou induza fins menos próprios que decorrem da potencial exploração de sentimentos, representações e inquietações de um eleitorado que, neste momento, tem problemas muito sérios e que não deve, como os próprios protagonistas desta proposta dizem, continuar a ser distraído e enganado em relação ao essencial...
    Um abracinho grato e amigo com votos de bom fim-de-semana.

    ResponderEliminar
  3. Que ressuscite, ou que morra, mas definitivamente! Os portugueses têm esta tendência para se agarrarem a mitos e nevoeiros. O que está a acontecer com estas reprises é em termos politicos nojento. Esta Direita deu-nos aquele triste espectáculo do dia do seu funeral e isso já deveria bastar, mas não, trata-nos desta forma, como se o entendimento dos acontecimentos que nos rodeiam precisasse de uma matriz martelada todos os anos com ênfase em anos eleitorais, para daí estrairmos as conclusões nela programadas. Não é justo, porque me sinto como português tratado como um anormal, alguém a quem eles têm a veleidade de achar que é manipulável. Depois temos uma Comunicação Social totalmente dominada pelos amigos que se permitem alinhar neste triste espectáculo.

    ResponderEliminar
  4. Caro Graza,

    Agradeço-lhe sinceramente a frontalidade desassombrada e lúcida das palavras que aqui regista e que subscrevo.
    Volte sempre!

    ResponderEliminar
  5. Ana Paula Fitas,

    Fiz link para "A Carta a Garcia".
    Obrigado.
    OC

    ResponderEliminar
  6. Caro Osvaldo Castro,
    Grata pela referência que é sempre uma honra.
    Um abraço.

    ResponderEliminar
  7. Não discordo, na totalidade do que diz, aquilo que me parece é que Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, para falar só dos politicos, serão sempre lembrados no dia do acidente ou crime, como queira. E realmente, 30 anos e oito inquéritos depois, podem não chegar para tirar seja que conclusão for. Talvez na próxima geração ( eu já cá não estarei, para poder comentar seja o que for ), cheguem à conclusão que não terá sido atentado, ou que terá sido. Seria por acaso a primeira vez, que a justiça ( não digo a nossa, digo qualquer justiça ) viria a reconhecer um erro? 36 anos depois de " implantada " a democracia, vivemos por acaso num País, que é meu, democrata? Ou a Democracia não será igual para toda a gente? Não é natural que um PR ou um PM ou ainda algum politico que se preze, fale da morte, mal esclarecida, de um ex-PM e de um ex-ministro da defesa, na data em que desapareceram, só porque estamos perto de eleições? Ou estaremos a falar de hipocrisia, como a de é proibido fumar, mas não se acaba com a tabaqueira!!!! Radical? Talvez! Hipocrita? Nunca!
    Um abracinho, timido, mas sentido, por no meu País, nunca se chegar a conclusão nenhuma em assuntos melindrosos.

    ResponderEliminar
  8. Caro Zéparafuso,
    ... tem razão!... há demasiados casos por esclarecer, por cá (como bem referiu Ricardo Sá Fernandes - e apesar do facto não ser, na minha opinião, argumento para justificar nova comissão de inquérito já que as funções desta mais não serão do que avaliar o "caso Camarate" e não resgatar a História) e por todo o mundo. Por isso, compreendo e dou razão aos seus argumentos mas, insisto que a oportunidade é imprópria (porque no caso das eleições presidenciais a ética recomendaria distanciamento de matérias que podem ser interpretadas como "revanches" ideológicas) e que se torna uma espécie de "arma partidária" o seu retomar nesta altura - desde que a 8ª Comissão Parlamentar para o efeito terminou os seus trabalhos não teriam já tido tempo para reivindicar nova Comissão?!
    Um abracinho amigo e solidário e... bem-haja pela sua paciência e persistência! Assim se faz a Cidadania e a Democracia :)

    ResponderEliminar
  9. Cara Ana Paula Fitas

    Formar uma nova CI em vésperas de eleições, não é apenas exagerado, é mórbido.
    Na minha opinião, por muitas verdades que se queiram desenterrar, há que aceitar que D. Sebastião morreu. Hoje, depois de tantos séculos que passaram, qualquer facto novo sobre esse episódio servirá talvez para reescrever a História mas em nada alterará o rumo do Futuro dos Portugueses.
    Cumprimentos e votos de uma boa noite
    Ferreira

    ResponderEliminar
  10. Caro Ferreira, M.S.

    ... "mórbido" é a palavra que não quis escrever e que, por isso, muito lhe agradeço ter escrito por mim :)
    Há, de facto, nesta insistência em ressuscitar "fantasmas" em momentos específicos (repare que hoje mesmo, PSD e CDS, na homenagem a Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa afirmaram a sua determinação em "refazer" a AD - curioso, é o mínimo que se pode dizer, não?) uma certa sedução manipulatória que, em termos de nacionalismos, remete para velhos sebastianismos :)
    Um abraço amigo e solidário com votos de serenidade e sucesso.

    ResponderEliminar