
Surpreende? Não, não surpreende... nem os que sempre apresentaram reservas à integração dos seus países no espaço comum do que hoje é a União Europeia, nem aos que, indefectivelmente, têm defendido (de Jacques Delors aos cidadãos e sindicatos) a construção de uma Europa Social contra a "
tese" sempre aqui relembrada, da Europa a Duas Velocidades. Refiro-me, naturalmente, às declarações de Angela Merkel que veio hoje, oportunisticamente e em detrimento do sentido de responsabilidade social que se exige, também!, aos responsáveis políticos da UE , dar a conhecer à opinião pública, afirmando que a Alemanha, a partir de hoje, não irá contribuir para ajudar mais nenhum país (leia-se: Estado-membro da UE) em situação financeira grave pois considera que Berlim atingiu o limite da sua disponibilidade para tal, com a resposta às actuais crises de que a Grécia e a Irlanda são os mais mediaticamente recentes protagonistas. Independentemente das afirmações do Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, ter, também hoje, afirmado que "
a Europa está preparada para enfrentar outra crise", as declarações alemãs revelam: a) sinais de fraqueza da economia alemã considerada até agora como uma espécie de "
economia-de-ferro" da UE e, consequentemente, um sintoma alarmante sobre o estado económico-financeiro da própria UE; b) que a retoma económica europeia está muito longe de ser alcançada; c) que se está a instalar a primeira grande crise política da UE com um dos seus mais antigos e estruturais Estados-membros a romper com os princípios do próprio Tratado de Roma (princípios considerados traves-mestras da arquitectura europeia e que não tendo sofrido alteração nas suas revisões ou na formulação dos Tratados seguintes, continuam, felizmente!!!, vigentes na jurisprudência comunitária), a saber, os Princípios da Subsidiariedade e da Solidariedade... Depois de décadas de emissão de mensagens sobre a importância social da integração e da consolidação europeia, veio agora a Senhora Angela Merkel mostrar o rosto do lado negro da UE: o da sua natureza neo-liberal capaz de hipotecar os interesses sociais das populações e os compromissos políticos em nome da defesa dos interesses do grande capital financeiro. Lamentável? Sim! Surpreendente? Não!
Cara Ana Paula
ResponderEliminarReforço o seu final: Lamentável? Sim! Surpreendente? Não!
Entretanto, são imprevisiveis as consequências...
Abraço
Caro Rogério,
ResponderEliminar... e a imprevisibilidade das consequências, essa sim, é que deveria preocupar Governos, partidos e cidadãos... contudo, continuamos a assistir ao espectáculo mediático que tenta fazer-nos tomar o desejável das aparências pela realidade... a crise não acabou e não vai acabar tão cedo... entretanto, entre o passado recente, o presente e o futuro próximo a curto e médio prazo, vamos registar significativas mudanças que se tornarão de ainda mais difícil gestão para todos...
Abraço.
Querida Ana Paula
ResponderEliminarObrigada pelo post, muito esclarecedor!
Uma vergonha a Srª Merkel, deu o tiro de partida para o salve-se quem puder...
Beijinho
Divido-me, mas decido-me neste impasse da Europa. Compreendo que, dado cada país ainda ser um estado soberano é sua a responsabilidade da política que prossegue e respectiva influência na economia do seu território.
ResponderEliminarÉ facto que a moeda única limita a liberdade de acção mas não a tolhe inteiramente. O ponto fraco, oculto, é a inaptidão estratégica dos governantes de cada estado e a aliança espúria e demagógica com o eleitorado ignorante e manipulado.
A crise capitalista ocidental derivou mesmo da deslocalização mundial das indústrias para os países rurais subdesenvolvidos, compensando-se a diminuição do poder de compra dos assalariados ocidentais com as facilidades de crédito ao consumo e habitação.
A diminuição da proporção dos salários no rendimento nacional de cada país nos útimos dez a vinte anos foi viabilizada com a ilusão da sustentação do consumo por via do endividamento e fitícia valorização do imobiliário corrente edificado, único tipo de mais-valia que não pôde migrar para ir explorar a mão-de-obra no Oriente...
Agora, posto que na Europa não há nenhum federalismo responsável que arque com os desequilíbrios domésticos dos estados membros, apenas vejo a alternativa de uma actuação defensiva, enérgica, na forma de tributar pesadamente os bens e serviços com uma componente importada acima de uma dada proporção e subsidiar alguns custos das indústrias exportadoras. Isto, para lá das medidas já planeadas de controlo da despesa pública.
A estratégia da redução de salários e pensões pode favorecer a competitividade da produção nacional, mas não pode deixar de ser acompanhada de queda quase-proporcional de preços na generalidade dos ditos bens e serviços "não-transaccionáveis" e da racionalização de um novo tipo de consumo de massas, timbre de um novo modo de vida das populações europeias.
Obrigado, querida Ariel :)
ResponderEliminar... é fundamental estarmos atentas a esta lógica tão pouco empenhada na construção do bem-comum... como a Ariel diz, este foi o "tiro de partida para o salve-se quem puder" - obrigado pela feliz formulação do cerne da questão, minha amiga :)
Beijinho.
Caro VBM,
ResponderEliminarÉ uma honra ter aqui este seu texto, lúcido e esclarecedor sobre a dinâmica interna do funcionamento comunitário onde, a par da ainda vigente soberania dos Estados, os mecanimos federalistas não têm a expressão que, no caso, poderia ajudar ao reequilíbrio... ficamos todos, assim, mais sózinhos e expostos, no contexto da fragilidades económicas nacionais a que se responde com uma incontornável redução da despesa pública que, contudo, "pesa" aos cidadãos sem aumentar a produção de forma capaz de justificar o nosso optimismo no futuro próximo... e, como bem diz, VBM, e ainda hoje ouvi população irlandesa comprovar, a única solução é, de facto, convencermos e agirmos de acordo com um novo tipo de "consumo de massas" e "um novo modo de vida"... Obrigado, VBM.
Um abraço.