segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Sísifo - Reflexo e Recurso da Ideologia Político-Económica


Durante muito tempo, o pensamento dominante organizou a percepção e a representação da realidade de forma dicotómica - filosoficamente, esta categorização da estrutura organizacional do pensamento ficou conhecida por cartesianismo e em termos ideológicos perspectivou-se, já contemporaneamente, na distinção entre pensamento marxista e pensamento hegeliano. Hoje, depois das triagens que os exercícios críticos dos postulados políticos imprimiram a estas "visões do mundo", o problema deveria colocar-se, pragmaticamente, da seguinte forma: estaremos a viver um tempo e um espaço de dúvida relativamente ao juízo com que reconhecemos, subjacente às decisões, a prevalência da dimensão económica sobre a política - sabendo-se que a economia é movida, sob a imensa teia dos interesses financeiros que aparentam esgotar-se em si próprios, por concepções ideológicas? ... olhar o real, transmutá-lo e devolvê-lo à realidade é a forma poética de enunciar a capacidade do sujeito apreender os objectos e hoje, depois da convicção defensora da prevalência do económico sobre o ideológico e do seu inverso (a saber, a prevalência do ideológico sobre o económico), é legítima a hipótese de se equacionar a gestão do mundo desenvolvido como estratégica ideológica de uso da economia de mercado para viabilizar a dominação das estruturas tradicionais do poder, permitindo o acesso ao seu contrário (teorias planificadas, socializantes ou defensoras do Estado Social) para constatar a sua falibilidade na criação de riqueza, legitimando-se assim, por exclusão de partes, a continuidade e o reforço no (re)investimento das lógicas assentes na privatização, na discriminação e na hierarquização vertical. Há uns anos atrás, a esquerda constatava, com surpresa!, a apropriação da leitura marxista da realidade pela direita e quando se deu conta, entre o exercício e a luta pela conquista do poder em contextos democráticos, a causa dos desprotegidos tornou-se o reino demagógico da mensagem política da direita... devolver o discurso aos princípios e às práticas em termos evidenciáveis no plano do concreto, é o que os cidadãos exigem hoje à política e é esse o cerne da resposta para a procura e o depósito da confiança que teima permanecer na posse dos que decidem conjunturalmente, nos períodos eleitorais. Porém, enquanto o usufruto efémero do poder político se mantiver como objectivo maior da luta ideológica, a economia aparentará uma autonomia sem rosto e os cidadãos continuarão a perspectivar a existência humana como uma fatalidade reduzida à reprodução do eterno mito de Sísifo.

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