terça-feira, 16 de dezembro de 2008

E Deus sorriu...


"E Deus sorriu..." - disse-o o conhecido Bispo de Setúbal, D.Manuel Martins, citando um autor espanhol que, sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos, colocou na boca de Deus a seguinte frase: "(...) Depois do Sermão da Montanha proclamado por meu filho, esta Declaração foi o que de mais bonito foi produzido pelos homens.(...)". D. Manuel Martins, a quem chegaram a chamar "Bispo Vermelho" pela sua defesa dos mais pobres e excluídos, falava na cerimónia de atribuição do Prémio anual da Assembleia da República que assinala os aniversários daquela Declaração. D. Manuel Martins, tal como Maria Lamas, a escritora, a pedagoga, a jornalista, a humanista e comunista Mulher que dedicou a vida e a obra à cidadania e à promoção da paz, Francisco Sá Carneiro, social-democrata que levantou a voz contra os atentados do regime ditatorial que durante 48 anos calou e oprimiu os direitos das pessoas, chegando a visitar presos políticos e integrando a luta pela consolidação institucional da democracia e Mário Soares, personalidade de prestígio internacional, cuja vida se construiu na defesa da democracia e dos direitos das pessoas, dos povos e das culturas em contextos históricos diversos em que protagonizou e ainda protagoniza, uma voz insistente e clarividente, foram os cidadãos que, este ano, a Assembleia da República escolheu para agraciar com o Prémio dos Direitos Humanos. A escolha, potencialmente polémica, foi, sem dúvida, corajosa e uma lição de democracia que, apesar do seu significado simbólico, parece ter passado despercebida à comunicação social sempre atenta a conflitos e menos do que seria desejável aos símbolos da coexistência pacífica de que todas as sociedades, reconhecidamente, tanto carecem... Segui a cerimónia do 10 de Dezembro, através do canal Parlamento, na madrugada de hoje, dia 16 e, no silêncio da noite ouvi, com atenção, todos os discursos desta cerimónia... e senti que, felizmente!, no nosso país, a dignidade tem ainda protagonistas temerários e respeitáveis. Senti-o perante o discurso do Presidente da Comissão Parlamentar dos Direitos Constitucionais, Liberdades e Garantias, Osvaldo Castro, que enquadrou, de forma convicta, justa e adequada, a celebração dos 60 Anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e perante os discursos dos agraciados, feitos de palavras honestas, sentidas e humildes, denotando o quão mereceram este Prémio. O que me impressionou de forma particular foi ter sido uma cerimónia que uniu o melhor do que é diferente e coexiste e o facto deste acontecimento ter decorrido na Assembleia da República que simbolizou, neste dia, a justeza do equilíbrio que é possível praticar no exercício dos valores e das práticas... senti-o porque, a culminar este simbolismo já de si surpreendente e raro, além das Medalhas do Cinquentenário que foram atribuídas aos premiados, o Prémio Anual dos Direitos Humanos foi atribuído aos Bombeiros Voluntários de Portugal, homenageando-se assim o melhor da sociedade civil, os anónimos desinteressados que investem a própria vida, no seu sentido mais literal, na defesa do bem-comum, sem discriminação, por todos e por qualquer cidadão... A sociedade portuguesa fica, com esta cerimónia, simbolicamente, mais coesa através do seu significado e da sua legitimação também simbólica com o discurso de encerramento produzido pelo Presidente da Casa da Democracia, Jaime Gama... porque, apesar de não haver pessoas, instituições ou entidades perfeitas, há, contudo, os que fazem o melhor que sabem e que podem pelos Outros... e, nos outros, está o reflexo de cada um! O sorriso de Deus não tem religião... tem, isso sim, a divindade que se encontra no melhor do ser-se humano!... não será, por isso, excessivo, ver nesta cerimónia um apelo à união dos Cidadãos e dos Povos!

2 comentários:

  1. Texto muito bonito e edificante...
    Ainda há quem confie nos seres humanos e nos seus direitos.

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  2. Muito agradeço as suas palavras, Sokinus... confiar é o caminho das construções sólidas com que vamos edificando as transformações do mundo no percurso de regresso ao coração de si: a dignidade humana...

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